É um erro compreensível, humano, e até mesmo ingénuo.
O assessor pode incidir neste erro, e muitos o fazem porque, em primeiro
lugar 'houve um momento em que ele foi indispensável' e as evidências desta sua
condição, eram óbvias para ele, talvez para alguns outros do círculo mais
próximo do líder e, para o seu chefe que, implícita ou explicitamente,
demonstrou pensar assim. Quando este 'momento' ocorreu não nos importa aqui. O
fato é que ocorreu.
Há ocasiões em que o assessor se supera; em outras, frente a um problema
aparentemente sem solução, ele surpreende com uma solução clara, límpida,
consistente que permite resolver a dificuldade; outras vezes, seu trabalho é
tão intenso, possui tantas delegações de autoridade, que economiza tempo
precioso para seu chefe se dedicar a outras acções.
Em condições como estas, insinua-se na mente do assessor uma perigosa
convicção: ele é indispensável. Está seguro em sua função porque seu chefe
'depende' dele, 'não conseguiria levar suas actividades sem a sua ajuda e
conselho'.
Pode ocorrer que relações desta natureza se mantenham por muitos anos,
algumas por toda a carreira do político. Para que isto suceda, é necessário que
o chefe seja um tipo especial de político e o assessor, um tipo especial de
assessor.
Pessoas muito ambiciosas, competitivas, agressivas acomodam-se com muita
dificuldade neste perfil. São indivíduos que estão sempre fazendo novas
relações, conhecendo novas pessoas, descobrindo as falhas de sua estrutura de
apoio, e as virtudes das dos outros.
São políticos que têm pressa, que buscam 'atalhos', que têm lances
ousados, aceitam o risco. Em consequência, são 'políticos compradores' no
sentido de mercado. Isto é, estarão sempre dispostos a buscar no mercado,
auxiliares que o ajudem a alcançar as metas que se propõem, não hesitando em
mudar sua equipe de apoio, quando julgar conveniente.
Não é este o sentimento do assessor. Este desenvolve muitas vezes uma
relação de afecto, estima e protecção em relação ao seu chefe que, combinada com
aquele sentimento de se perceber indispensável, justifica toda a sorte de
sacrifícios pessoais.
Há pois, nestes casos, duas curvas que têm entre si uma relação inversa
a do chefe evolui da intimidade pessoal para a instrumentalidade e o
distanciamento afectivo; e a do assessor evolui do profissionalismo objectivo para a amizade, admiração, intimidade e lealdade absoluta.
Amparado naquele sentimento de que é insubstituível e indispensável, o
assessor aposta na 'folga' de poder e prestígio que possui, não se sentindo
ameaçado não chega a fazer uma análise mais detida e mais objectiva da situação.
De repente, envolta numa explicação meio confusa de reformulação do
trabalho, amenizada por vagas referências sobre retornarem a trabalhar juntos
no futuro próximo, a notícia da sua dispensa chega-lhe como uma bomba. O choque
é brutal, sobretudo porque difícil de compreender as razões para ele. O
assessor busca na memória suas acções, seus erros e acertos, atrás daquela razão
que explicasse a dispensa.
Não é lá que vai encontrar. É na cabeça do político, na sua ambição, na
sua postura de 'comprador' dos melhores talentos para ajudá-lo, na sua lealdade
condicionada, na disciplina que em silêncio adquiriu para subordinar seus sentimentos
aos seus planos, que a verdadeira explicação se encontra.
O sentimento de indispensabilidade é muito gratificante, mas tem o poder
de anestesiar o espírito crítico. O assessor deve lembrar-se que foi escolhido
por que possuía virtudes de argúcia, lucidez, malícia, subtileza analítica. No
poder, não deverá nunca delas se afastar. Deve usá-las em favor de seu chefe,
mas deve usá-las, por igual, a seu favor (por Letícia Wacholz, aqui)
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