sexta-feira, novembro 20, 2015

Opinião: A crise do PSD

A crise do PSD é profunda. É uma crise de identidade. Mas mais estranho do que tudo isto é o facto da nova postura deste partido ser contrária aos seus próprios interesses.
O PSD e os seus aliados acusaram António Costa e a esquerda de estarem dispostos a tudo para chegar ao poder. Tinham certamente razão, mas entretanto perderam-na. Aquilo que o PSD e os seus aliados têm estado a fazer nos últimos dias mostra que eles próprios estão dispostos a tudo, sem sentido da proporção ou do interesse nacional, para se manterem no poder. 
Como se pode levar a sério o ainda primeiro-ministro e outros agentes da direita quando acusam os seus adversários - que procuram explorar, ainda que de forma contestável, os recursos da democracia representativa - de actos tão graves como “golpe de estado”, “usurpação” ou “fraude eleitoral”? O discurso da direita está cada vez mais próximo daquilo que foi noutros tempos o discurso da extrema-esquerda, tanto na virulência como nos tiques anti-parlamentaristas.
Tem sido notado e com razão que a inflexão política do PS o afastou da sua matriz tradicional e que o partido hoje existente é já uma coisa distinta do PS de Mário Soares, ou até de António José Seguro. Mas muitos dos mesmos que se apressaram a notar isso parecem ter dificuldade em reconhecer que o PSD actual também não é já o partido de Sá-Carneiro, nem o de Cavaco Silva, nem o dos outros líderes anteriores ao actual.
O PSD é hoje um partido populista e radical de direita. Tem um discurso anti-parlamentar e demagógico. Faz apelo directo, não mediatizado pela representação política, ao povo, como se tivesse a apoiá-lo alguma maioria popular invisível. Procura, através do seu Governo de gestão, exercer poderes que é duvidoso que a Constituição lhe confira. Tenta a todo o custo salvaguardar os negócios dos amigos. Não hesita em fomentar alarmismos a nível nacional e internacional, apenas por tacticismo política. 
A crise do PSD é, portanto, profunda. É uma crise de identidade.
Mas mais estranho do que tudo isto é o facto da nova postura deste partido ser contrária aos seus próprios interesses. Face à radicalização do PS à esquerda, o PSD teria toda a vantagem em recentrar-se. Isso garantir-lhe-ia com certeza, juntamente com os seus aliados, uma maioria absoluta muito em breve. Então por que razão entrou o PSD numa deriva radical?
Creio que isso aconteceu, contra toda a racionalidade política, por puro farisaísmo ideológico. Aliás, esse farisaísmo não vem directamente de Passos Coelho, mas do grupo que o rodeia e é responsável pelos seus discursos. Se o militante médio do PSD soubesse como pensam e falam em privado essas pessoas ficaria seriamente preocupado. No fundo, esse grupo sempre esteve em torno de Passos Coelho desde o início da anterior legislatura. Mas conseguiu disfarçar a sua incivilidade e ódio à democracia. Agora, com o poder a fugir-lhe das mãos, revela a sua essência (texto de João Cardoso Rosas, Económico)

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