sábado, outubro 25, 2014

O conto do vigário outra vez na Madeira?

Diz o velho ditado popular que cada um é dono da sua vida, faz dela o que bem entender, que ninguém tem rigorosamente nada a ver com isso. Nada a dizer. Mas intriga-me uma certa ingenuidade de algumas pessoas - mesmo ressalvando as evidentes dificuldades porque passam largos sectores da sociedade madeirense e que porventura explicam estas situações - que parecem não ter aprendido as lições bem amargas da vida, concretamente as que resultaram do escândalo do Telexfree que causou o desastre em centenas de famílias. Sei bem o que se passou (e se passa) na zona leste da Madeira, nalgumas freguesias da zona oeste e ainda no Porto Santo. Estamos a falar de centenas de pessoas - para ser comedido... - que perderam alguns milhões de euros, mas que pelos vistos, alimentados porventura pela ilusão da recuperação célere do que perderam, voltam agora a deixar-se enganar por esquemas igualmente fraudulentos, corruptos e mafiosos, iguais ao famigerado telexfree, mas com nomes diferentes.
Já reparararam que nada melhor para enganar as pessoas que atribuir a estes esquemas piramidais fraudulentos, designações estrangeiras?
Sei que no Funchal, algures onde outrora foi poiso de negociatas que tiveram o desfecho lamentável que tiveram, em grande medida porque as pessoas nunca deram crédito aos avisos que eram feitos, incluindo na comunicação social, nem percebem o verdadeiro funcionamento destes esquemas que se auto-alimentam enquanto houver quem lhes encha a pança,  voltam a emergir esquemas fraudulentos semelhantes, que apostam nas poupanças das pessoas. E podem crer que sendo piramidais vão ter o mesmo fim do telexfree - é tudo um a questão de tempo - pelo que os mesmos angariadores do passado, ou outros por eles instruídos, quais vendedores de banha da cobra vão voltar a trazer a desgraça financeira a muitas famílias, as que voltem a cair no conto do vigário.
E os que não acreditam no que se passou, recomendo, caso queiram, que se informem quantas famílias solicitaram a falência judicial, depois da hecatombe do telexfree, quantas famílias, alimentadas pela ilusão do dinheiro fácil e de rendimentos complementares que lhes pudessem valer e ajudar a pagar as despesas - e quanto a isso nada a dizer, porque é legítimo que as pessoas, apertadas como estão, roubadas como são por cargas fiscais absolutamente criminosas, persigam qualquer promessa de ganhos adicionais, não valorizando o que está subjacente a tudo isso - ficaram completamente arruinadas, porque contraíram empréstimos bancários, pediram dinheiro emprestado e chegaram mesmo a usar dinheiro de familiares emigrados, situações estas que depois não foram capazes de regularizar.
Pensava, muito sinceramente, que tudo isso estivesse esclarecido e que o esquema corrupto do telexfree tivesse servido de lição. Pelos vistos enganei-me porque consta que esses embustes voltaram a surgir agora com outros nomes, mas com os mesmos protagonistas que enganaram tantas pessoas com o telexfree, com escritórios abertos numa determinada freguesia do Funchal, melhor dizendo, numa determinada zona da cidade que chegou a ser ponto de encontro destes esquemas e de todas estas aldrabices que deram no passado no que deram.
Obviamente que cada um é dono da sua vida, faz dela o que bem entender e ninguém tem nada a ver com  isso. O que importa neste caso, apenas isso, é que não se repitam situações dramáticas que já aconteceram com centenas de famílias (para ser comedido...), mesmo com cidadãos a título individual, a que se juntam outros processos de falência que se encontram pendentes nos tribunais. Garantiu-me um dia destes uma pessoa ligada a estes processos judiciais de falências que não fosse a solidariedade das famílias, ajudando os que foram enganados e roubados pelo telexfree, evitando assim situações mais extremas, e o drama social seria a uma escala bem mais dramática.
Às autoridades é simples manter o reforço da vigilância, cruzando dados (registos de propriedades e outros bens, indicadores fornecidos pelos bancos sobre rendimentos, etc), sobretudo procurando justificações para sinais exteriores de riqueza súbita, tendo como referência os rendimentos declarados. É simples perceber quando a bota não bate com a perdigota. Porque não é o povo simples nem as famílias mais humildes que jogam as suas parcas poupanças em busca de algum lucro adicional para pagar as despesas da cada e dos filhos, que não posso criticar, pelo contrário, percebo e acho natural. Estamos a falar dos que continuam a jogar com o dinheiro que roubaram aos que acabaram por perder tudo nestes esquemas piramidais absolutamente mafiosos.
Isto faz-me lembrar o que se passou com o descalabro do BES e com investimentos arriscados. Uma espécie de telexfree com outro nome, porque era mais pomposo, associado a um banco. Milhares e pessoas perderam tudo o que tinham, instituições religiosas incluídas, empresas, empresários, políticos, etc. Tudo porquê? Porque acreditaram num banco que sabia esconder os seus problemas, apostaram em produtos que prometiam rendimentos elevados e rápidos, mas que não tinham qualquer sustentabilidade. Quando a instabilidade bancária surgiu em força, tudo isso ficou reduzido a nada. Um rolo de papel higiénico valia mais do que essa papelada toda que o BES vendeu a essas pessoas, alimentadas pela esperança de uma rentabilidade que obviamente alguns amealharam, antes de tudo ter ruído.
Concluo com aquele provérbio de incontestável actualidade: "À primeira, qualquer cai. À segunda cai quem quer"