quarta-feira, maio 29, 2013

Opinião: "Eleições (I)?"




"Quando numa reunião partidária, em Julho do ano passado, Coelho, a propósito da actuação do governo - que então estava muito longe da contestação que viria a ser alvo, sobretudo em Setembro desse ano com a tremenda manifestação nacional de contestação às mudanças na TSU, a qual apanhou de surpresa o executivo de coligação e instaurou um clima de medo entre os seus membros, consubstanciado no reforço de segurança, na redução do aparecimento em actos públicos, no aumento da contestação popular, etc - afirmou que entre a manutenção do rumo e das opções governativas e as eleições, escolhia claramente a primeira, sustentando que se "lixem as eleições" estava a fazer um mero exercício de demagogia barata e a desvalorizar antecipadamente o desfecho eleitoral deste ano que sabia então lhe seria penoso e desfavorável.
Recordo que essas declarações de Coelho, a roçar o patético foram feitas numa reunião com os deputados social-democratas a quem Passos lembrou que nenhum deles tinha sido eleito para ganhar as próximas eleições e que estava disposto a sacrificar os resultados eleitorais pelo interesse nacional. “Se algum dia tiver de perder umas eleições em Portugal para salvar o país, como se diz, que se lixem as eleições, o que interessa é Portugal”, declarou, numa declaração ridícula que não foi levada a sério. Salvo pelos deputados do PSD, tidos como os alvos preferenciais destes avisos de um governante enfraquecido e ilegitimado, sem a base eleitoral que lhe tinha propiciado a vitória em Junho de 2011, em eleições convocadas em circunstancias que a história um dia desvendará ao revelar-nos toda a verdade dobre o que se passou entre Janeiro e Março desse ano. “Nenhum dos senhores ou das senhoras foi eleito para esse mandato. Nenhum dos que aqui estão foi eleito para ganhar as próximas eleições, ou para ajudar a ganhar autárquicas, nem as regionais deste ano nos Açores, nem as europeias que aí vêm a seguir, não foi para isso que fomos eleitos” disse na altura perante o frenético aplauso dos deputados laranjas, claramente os destinatários do aviso, numa demonstração de como política e hipocrisia continuam de braço dado.
Aliás, nesta sequência, não deve espantar a ninguém o facto de Passos Coelho ter afirmado mais recentemente, durante uma festa comemorativa dos 39 anos do PSD, que não se demitirá se perder as eleições autárquicas, ao contrário do que como aconteceu com o socialista António Guterres. Passos sabe que vai perder, sabe que o PSD perdeu a maior parte da base eleitoral de apoio obtida em Junho de 2011, e que não era toda naturalmente sua, sabe que a coligação sofrerá ainda maior desgaste até Setembro, data de realização das eleições, devido aas medidas que têm na calha, mas não sabe qual será a dimensão dessa derrota nem quais as consequências políticas para os dois partidos da coligação que daí resultarão.
Se o PSD perder as principais camaras municipais do país, onde está sujeito não apenas ao desgaste social e eleitoral, mas também aa pressão de candidaturas independentes - muitas delas com origem nas próprias bases social-democratas... - a questão da liderança do PSD e da legitimidade do actual governo de coligação coloca-se. Aliás foi isso mesmo que aconteceu com Guterres, quando se demitiu em 2003 depois da derrota nas autárquicas, embora neste caso, e para além das divergências políticas que existiam, estamos a falar de um político com valores éticos e com a noção da dimensão da política, dos seus limites e da própria legitimidade dos seus protagonistas.
Derrotado nas autárquicas, Guterres sentiu-se derrotado e sem espaço de manobra para o exercício da sua governação, pelo que se demitiu. Penso que se estes políticos hoje no poder, tivessem a mesma dignidade, que não têm, e os mesmos valores e princípios de Guterres, que não têm, teriam, por sua iniciativa, em vez de a isso serem obrigados, que fazer o mesmo que aquele dirigente socialista, independentemente do facto de todos sabermos que estamos perante uma horda de oportunistas utra-neoliberais, a roçar o protofascismo mais asqueroso e nojento, que persegue uma agenda ideológica que, para ser concretizada, precisa que o poder partidário, tomado de assalto e em circunstancias que um dia todos ficaremos a conhecer com verdade, seja mantido, custe o que custar.
O que é que Passos faz? Antecipa-se e ameaça. Não se demite mesmo que perca, embora sabendo que vai sofrer uma copiosa derrota, apesar da especificidade das eleições autárquicas e de eu continuar a entender que os eleitores, até para sua própria defesa, não devem confundir o desejo natural e compreensível de penalizar este poder desprezível, com a escolha daqueles que são os que à partida melhor condições terão para zelar pelos seus interesses enquanto colectividades organizadas, na freguesia ou nos municípios. 
Ou seja, para ser mais claro, não me parece normal que se arrisque penalizar uma candidatura do PSD, que reúne todas as condições para defender os seus eleitores e realizar um bom trabalho, só porque é do PSD pelo que, estando associada ao poder e aa coligação no poder em Lisboa, isso constitui motivo mais do que suficiente para que seja derrotada nas urnas. É um risco que determinadas candidaturas correm, é, no caso de algumas delas, um desfecho previsível, mas isso não me leva a considerar, longe disso, que seja a melhor opção dos eleitores. 
O problema - este é o principal desafio dos partidos, mais do que andar a gastar dinheiro em comícios ou outras encenações de campanha eleitoral, que nesta conjuntura de contenção e de crise podem até ter um efeito contrário junto dos cidadãos - é que estas eleições autárquicas são, no que a essa questão diz respeito, as mais difíceis e problemáticas de sempre. Estamos por isso a falar, há que dize-lo, da necessidade de cuidados duplicados. 
Desde logo porque são as primeiras eleições depois de Junho de 2011 e de dois anos de uma criminosa austeridade imposta por um governo protofascista, arrogante, mentiroso, manipulador, incompetente, que se limita a impor a austeridade por decreto, a roubar salários e pensões, a esmagar direitos sociais, a perseguir idosos e pensionistas, a encher a pança dos credores com milhares de milhões de euros de euros, leia-se com lucros agiotas, a estender a carpete vermelha aos alemães e aos especuladores europeus seus aliados e a chupar os portugueses até ao tutano, cobrando-lhes impostos em nome de uma das mais pesadas cargas fiscais da Europa" (LFM-JM)