quinta-feira, setembro 29, 2011

Opinião: ESQUARTEJEMOS O PAÍS…

"A questão do endividamento da Madeira – e quanto aos Açores veremos depois de Novembro, e ao longo de 2012, ano de eleições, a verdade oculta… - já anunciado em 5.800 milhões de euros, menos do que os actuais 6.000 milhões de euros já espatifados pelo Estado no BPN, pode conduzir o debate em torno das questões financeiras para a perigosa apologia do “esquartejamento” do país, sempre que se trate de responsabilizar os cidadãos pelo pagamento de dívidas públicas e particularmente de dívidas de empresas públicas altamente deficitárias.
A realidade, que transcende os comentadores que todos os dias se exibem nas televisões a perorar, regra geral todos contra a Madeira – não há caras novas? – muitos deles reféns de motivações políticas desvalorizadas ou com ligações partidárias ocultadas deliberadamente, aponta para a inevitabilidade (uma questão de tempo) de um esquartejamento do país.
Antes disso subsiste uma dúvida: afinal o que estão a julgar? O tal “buraco” dos 1.100 milhões de euros reportados a facturas referentes a obras realizadas na Madeira, ou o procedimento de omissão dessa documentação, por razões que foram devidamente explicadas (e sobre as quais cada um julgará os procedimentos como entender)? Se for pela dimensão do “buraco”, então percebe-se que os cerca de 6 a 8 milhões de euros de facturas “esquecidas” numa secretária do Instituto de Desporto de Portugal, sem cabimento orçamental e reportadas a obras realizadas e que nunca foram oficialmente incluídas nos circuitos contabilísticos daquele organismo, sejam rapidamente esquecidos. Mas se se trata de julgar o procedimento de omissão, então estamos a falar de situações exactamente iguais mas que são objecto de um tratamento informativo distinto, por razões que se percebe facilmente e que tem sobretudo a ver com o momento eleitoral que vivemos. Ressalvando a diferença, isto seria como comparar dois réus, acusados de matarem a tiro um vizinho, um cidadão nacional que provavelmente beneficiaria da tolerância dos “opinion makers” (que rapidamente encontrariam justificações para o acto…) enquanto o outro, por exemplo por ser estrangeiro, seria julgado antecipadamente na praça pública, e condenado, mesmo sem ser julgado.
Mas há coisas que temos que explicar.
É sabido que o Estado espatifou no BPN cerca de 6 mil milhões de euros para cobrir um buraco calculado em 3 mil milhões e assegurar outras garantias que o banco precisava. Há dias, afinal, já se falava que o buraco do banco afinal poderia ser de 4.300 milhões de euros, o que implicará que o Estado tenha que ali “queimar” mais 2.000 a 2.500 milhões de euros. Para realizar obras? Não. Para garantir o Estado social? Não. Para cobrir gestões corruptas e para dar corpo a uma estranha, e até hoje não explicada nacionalização apressada de uma instituição bancária, deixando no ar a dúvida: para salvar quem? Para salvar o quê? Quem tinha mais dinheiro a perder na instituição em questão? Ninguém responde a nenhuma destas questões essenciais quando, por exemplo, no caso do outro banco falido – o BPP – o comportamento governativo foi diametralmente oposto.
Mas vamos a factos. A Madeira e os madeirenses têm a noção da realidade financeira em que se encontram. Penso que sabem que é decisivo negociar com a República. Mas sabem também que a manipulação de alguns descarados vai ao ponto de até parecer que a Madeira é a culpada da desgraça de um país falido em circunstâncias que todos sabem e tendo como protagonistas as pessoas que todos conhecem bem e que nunca foram julgadas criminalmente pelas responsabilidades que lhes cabem. Mas os madeirenses têm a noção de outras realidades. Recordo algumas delas, só para que não se esqueçam:
- Açores – dívida de 3,5 a 4 mil milhões de euros (?) mas como dizia há dias Braga de Macedo (que tratou do “rating” dos Açores!) na TVI, a seu tempo conheceremos a verdade;
- Espatifados no BPN cerca de 6 mil milhões que com o crescimento do buraco podem chegar aos 8 mil milhões ou mais;
- Empresas públicas falidas com um buraco superior a 50 mil milhões de euros;
- Dívida pública do estado português entre 160 a 200 mil milhões de euros;
- Buracos das SCUTs previstos para os próximos anos: mais de 25 mil milhões de euros
- Buraco das PPP previstos para os próximos anos: mais de 45 mil milhões de euros.
- Dívida da Madeira: 5.800 milhões de euros (valor anunciado pelo Governo regional da Madeira).
Mas porque razão refiro o risco de uma perigosa apologia do esquartejamento do país, sempre que se falar de pagamento de buracos?
- Porque razão os portugueses dos Açores, de Bragança ou de Faro, serão obrigados a pagar os défices enormes da Carris que não usam?
- Porque razão os portugueses de Coimbra, do Porto, da Madeira ou de Évora, são obrigados a pagar os prejuízos enormes do Metro de Lisboa, que não usam?
- Porque razão os portugueses de Castelo Branco, Aveiro ou Beja são obrigados a pagar os enormes prejuízos das falidas Transtejo e Soflusa, se não as utilizam?
- Porque razão os portugueses de Viana do Castelo, Braga, Madeira ou Viseu terão de pagar pelos enormes prejuízos das PPP Hospitalares em Lisboa se não as utilizam?
- Porque razão os portugueses de Lisboa, Faro, Açores, Madeira, terão de pagar os buracos de milhares de milhões com as SCUTs se não as utilizam?
- Porque razão os portugueses de Leiria, de Portalegre e outros do sul do país terão que pagar os prejuízos enormes do Metro do Porto, se não o utilizam?
- Porque razão os portugueses do Porto terão que pagar as PPP relativas a negócios feitos pelo Estado no sul, se não beneficiam nada com elas?
- Porque razão os portugueses do sul terão que pagar os buracos do Metro de Coimbra se não são seus utentes?
- Porque razão os portugueses da Madeira e dos Açores são obrigados a pagar os encargos sociais – que ninguém contesta – que o Estado social é obrigado a ter para acudir ao crescente número de pobres no continente, e sobretudo no Norte do País mais afectado pelo desemprego e pela falta de escolaridade?
- Porque razão os portugueses dos Açores e da Madeira terão que pagar os mais de 45 mil milhões relativos aos buracos das PPP no Continente?
- Porque razão os portugueses das ilhas ou do interior do país, onde o BPN nem negócios ou nem agências tinha, são obrigados a pagar os 6 mil milhões do buraco deste banco e que podem ser muito maiores?
Será que vamos entrar nesta fobia egoísta e segregacionista, responsabilizando cada região pelos encargos que lhe cabem? Ou vamos todos ter que fazer um esforço solidário, para que se ultrapasse rapidamente esta realidade dramática em que vivemos – e os madeirenses sabem que terão que fazer sacrifícios, tal como os açorianos a seu tempo farão – e regressemos a novos tempos, tempos em que podemos sonhar e ter esperança, sobretudo os mais jovens? E para isso não precisamos de oportunistas, demagogos e vendedores de banha-da-cobra ou encenações idiotas de quem sempre foi rico e nunca soube, nem sabe, o que é a pobreza e o desemprego
" (LFM, in Jornal da Madeira)

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