segunda-feira, janeiro 31, 2011

Presidenciais: o meu rescaldo (III)

"Escrevia esta semana um jornal local, não sei com que bases, que o PSD da Madeira provavelmente promoveria (ou deveria) um estudo para perceber as causas dos resultados eleitorais e essencialmente as razões da votação que o candidato presidencial José Manuel Coelho, apoiado pelo PND, alcançou na região. Não sei nem as fontes de informação que sustentaram esta notícia nem sequer se há credibilidade na mesma. O que me parece que é preciso haver, desde logo, é a percepção da realidade, sentir o pulsar do que se passa junto das pessoas, perceber o que elas pensam, as suas expectativa se frustrações, entender o impacto de certas medidas que afectaram os cidadãos e as famílias e até que ponto não estamos numa clara ante-câmara do que poderá ser uma mudança substancial na tal “lógica eleitoral” que não passa de um mito inventado por comentadores e alguns escritores de manuais. Há quanto muito uma tendência eleitoral, que oscila, comprovadamente como se verificou agora, ora de forma significativa, ora timidamente, uma vez influenciado os votos nos partidos e/ou candidatos, como aconteceu agoira na Madeira com Coelho, outras vezes reforçando a abstenção como por exemplo aconteceu mas regionais dos Açores de 2008 quando era suposto que as regionais, pela sua natureza, fossem os actos eleitorais mais mobilizadores. Nada de afirmações iluminadas, nada de exploração manipulada de resultados, nada de verdades absolutas.
Quando se fala em eleições, fala-se na expressão da vontade das pessoas num determinado momento. O chamado voto vinculado – em que as pessoas votam sempre num partido, aconteça o que acontecer, por ser essa a sua filiação partidária – é cada vez mais reduzido. Não esquecer que estamos a falar de partidos que nem sequer têm 10% do seu eleitorado filiado, e quem disser o contrário mente. Estamos a falar de partidos que se não fossem as subvenções públicas que recebem, fechavam portas porque as parcas receitas provenientes das quotas, provavelmente nem a conta da água e da luz pagariam. Há, isso sim, uma larga faixa, fenómeno á comprovado nalguns estudos realizados por algumas universidades, que tem a ver com o chamado eleitorado flutuante, que não se sente vinculado a ninguém, que ora vota hoje de uma determinada forma, como amanhã vota de forma diferente, mas que acaba por ter um papel importante, por vezes decisivo no desfecho eleitoral. Finalmente, há ainda que ter em consideração a própria natureza do acto eleitoral em si mesmo, o que ele representa e o que por vias dele está em causa, factores valorizados ou não pelos eleitores, conforme o entendimento que por estes é dado a uma conjugação de factores vários, que tanto podem servir para encarar de forma séria uma ida às urnas, como pode ser aproveitada para se transformar num instrumento de contestação ou até de ridicularização do sistema político, dos seus protagonistas e dos candidatos.
Como se percebe, as respostas não existem, não há verdades absolutas, nem os estudos servem para coisa nenhuma. O que pode ser solicitado são sondagens de opinião junto dos cidadãos, não especificamente eleitorais, tentando perceber a frustração dos cidadãos, o que querem, o que esperam, que expectativas têm, o que criticam. O PSD da Madeira fez isso há uns anos, tinha um quadro claro, concelho a concelho, do que as pessoas pensavam, do que queriam, das suas reivindicações, do que era mais ou menos importante para elas, que opiniões tinham da política e dos partidos, etc. E lembro-me que as diferenças entre os concelhos eram evidentes, porque cada município tem, no interior do seu espaço humano e geográfico, especificidades próprias que variam até entre concelhos vizinhos.
Os resultados eleitorais são muitas vezes influenciados pelo estado de espírito das pessoas, ou seja, por factores conjunturais exógenos, que partidos e políticos não controlam, mas que podem ser num dado contexto conjuntural suficientemente fortes para influenciarem as opções de voto das pessoas, mas que podem deixar de funcionar da mesma forma amanhã, noutro acto eleitoral posterior. Quando dois dias antes das eleições presidenciais, por exemplo, milhares de pessoas, funcionários públicos, receberam os seus recibos de vencimentos e constataram que todos tiveram reduções motivadas não apenas pelos cortes percentuais de salários, mas pelo aumento de descontos para a segurança social (e ADSE), o que estarão os partidos e os políticos à espera? Que essas pessoas esqueçam o que passará a ser uma realidade mensal quotidiana daquelas famílias e não dêem expressão ao seu descontentamento e penalizem aqueles que elas acham serem os autores políticos e cúmplices destas medidas?! Se pensam assim, então estão a mais na política e não podem analisar os fenómenos eleitorais com isenção e de forma séria. Perante situações destas, nem a militância, nem a filiação partidárias contam. E o mesmo se passa com famílias que se confrontam com o desemprego e percebem que os jovens terão dificuldade em encontrar empregos dignos. Como querem que elas reajam? Votando nos partidos que não lhe são as respostas que elas querem e esperam?! O que para essas pessoas conta é apenas a decisão de protestar ou não, naquele momento, quando elas têm um boletim de voto e votam sozinhas, em silêncio, de forma desinibida, livre, em função da sua consciência.
Para além de todo isto, e insisto neste ponto, a tal lógica eleitoral” das eleições regionais, pouco ou nada têm a ver com a mesma “lógica eleitoral” das eleições europeias, por natureza distantes das pessoas e pior ainda no caso das presidenciais, onde a componente partidária funciona abertamente (!) e onde a amplitude do distanciamento entre o candidato e o eleitor supera o que se passa nas europeias tendencialmente as que maior abstenção registam. Não existem estudos concretos, porque teriam que assentar na análise da composição etária ao nível das diferentes mesas eleitorais, mas é pacífico que os eleitores mais idosos começaram a deixar de votar – por natureza eram os mais conservadores nas suas opções – ou porque faleceram, ou porque estão doentes, ou porque se desinteressaram em fenómeno eleitoral, e que há uma geração esmagadora de eleitorado que hoje vota - ou não vota (?) - que se encontra na faixa etária dos 18 a 20 anos, que nada têm a ver com o passado e nem sequer com a primeira década do pós-25 de Abril. E depois há uma mancha de eleitores, que provavelmente será a mais importante, que se encontra entre os 45 e os 55 anos, que viveram os últimos anos do regime anterior, dele têm apenas uma percepção distante, mas que viveram, isso sim, todo o percurso da revolução de Abril e da autonomia desde 1974 e que são no fundo os que ainda mantêm alguma coerência ideológica e militância partidária
Ninguém sabe na Madeira, e isso seria importante, a caracterização das mesas eleitorais. Antigamente sabia-se que, salvo algumas oscilações, as mesas iniciais correspondiam aos eleitores etariamente mais idosos, e as mesas mais recentes eram preenchidas pelos novos eleitores, os mais jovens. Hoje isso pulverizou-se. Misturaram-se as transferências de residência e com a aplicação do chamado cartão do cidadão, e mesmo antes dele, funciona a lógica correcta da proximidade das pessoas das secções de voto, em função da residência.
Terminei ontem uma série de quadros eleitorais comparativos, incluindo algumas projecções matemáticas que não passam disso mesmo, que pensavam poder trazer hoje, mas que deixarei para amanhã. Os números são soberanos.
Dar-vos-ei contudo apenas uma ideia para reflexão. Escolhi cinco freguesias -. Monte, Santo António, Tabua, Serra de Água e Curral das Freiras – que foram das mais afectadas pelos temporais do ano passado e onde é fácil imaginar o estado de espírito das pessoas.
No Monte - comparando os resultados das regionais de 2007 (eu sei, eu sei, não se pode comparar eleições diferentes, eu próprio o tenho referido, mas numa lógica de exercício matemático e de lógica política nada me impede de o fazer) - os ganhos eleitorais de Coelho face ao PND (42,84%), são quase os mesmos correspondentes às perdas eleitorais dos partidos apoiantes de Cavaco (PSD+CDS) e Alegre (PS+Bloco) comparativamente às regionais de 2007 (menos 39,61%). E falta considerar depois a abstenção! No caso do Curral das Freiras, o que Coelho ganhou face ao PND em 2007 (20,98%) quase que corresponde às perdas conjunturas do PSD/CDS (Cavaco) e PS/Bloco (Alegre), que foi der 21,16%. Na Tabua, Coelho aumentou 34,79% face ao PND mas Alegre e Cavaco perderam 33,96% comparativamente aos votos que os respectivos atidos obtiveram nas regionais de 2007. Na Serra d´Agua o que Coelho ganhou (37,59%) face ao PND é quase igual ao que os partidos apoiantes de Cavaco e Alegre perderam (37,91%). Finalmente em Santo António, os mais 43,27% de votos que Coelho alcançou face aos que o PND teve em 2007, é um pouco superior aos 38,39% correspondentes aos votos que os partidos apoiantes de Cavaco e de Alegre, comparativamente, perderam face às regionais. Querem melhor prova do que atrás referi quando ao eleitorado flutuante e ao voto cada vez menos vinculado a partidos e afectado por factores exógenos que nem políticos e partidos controlam?! Não me venham com conversas da treta. As presidenciais de 2011 foram as primeiras eleições depois dos temporais de 2010 na Madeira. Provavelmente poderiam começar por aí se querem fazer “estudos”, pelo ponto da situação, pela análise no terreno do que já foi feito, do que poderia ter sido feito e ainda não foi, de quais têm sido as prioridades, do estado de espírito das pessoas que vivem naquelas zonas, etc. Amanha trago-vos mais resultados
" (in Jornal da Madeira)

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