segunda-feira, janeiro 31, 2011

Presidenciais: o meu rescaldo (II)

"Insisto na ideia - porque é fundamental - que cada eleição tem um contexto, uma natureza, uma amplitude e resultados próprios. Manuel Alegre também contava este ano com os resultados obtidos por ele nas presidenciais de 2006 e foi o que se viu! Extrapolar um acto eleitoral para outro, cruzando dados, não passa de um mero exercício matemático curioso, mas sem base consistente nem credibilidade. Quando analiso um acto eleitoral faço-o em função da minha opinião e da análise dos resultados. Nunca desvalorizo resultados, sejam eles quais forem, porque acho que as eleições têm sempre um sinal em concreto. O que não faço é enxovalhar os eleitores num acto eleitoral, porque votaram, noutros partidos, chamando-os de “vilões” ou “analfabetos” e depois “apaparicá-los” todos quando votam em sentido diferente. A vontade do povo é sempre soberana.
O que se passou na Madeira não foi um acaso, pois não aceito que milhares de pessoas tenham saído de cada, em dia de chuva, frio, nevoeiro e neve, para votar como votaram, apenas por capricho. Houve uma deliberada intenção de dizer alguma coisa e de usar o voto, desta feita nas presidenciais, para enviar sinais, dando desta forma expressão a uma insatisfação popular mais do que evidente, e que vai agravar-se. Depois houve a particularidade de milhares de funcionários públicos por esse país fora que nessa semana perceberam, finalmente, a dimensão do impacto nos seus salários da aplicação das medidas do governo socialista e no agravamento do custo de vida. Não é prudente nem inteligente dissociar as eleições destas realidades sociais.
Acham que os madeirenses pretendem que José Manuel Coelho seja o inquilino da Quinta Vigia?! Francamente! O problema é que, com o discurso que ele utiliza, regra geral assente no insulto e na suspeição - independentemente até da razão que possa ter nalgumas das situações abordadas - Coelho e o PND (que neste acto eleitoral deliberadamente ”desapareceu” para reservar o protagonismo mediático a quem pode dar corpo à estratégia eleitoral e fazer o que os mentores do discurso e dos comportamentos mediáticos não fazem, até por razões de estatuto social) pretendem assumir-se como uma espécie de porta-vozes de pessoas que usam os actos eleitorais para exprimirem um estado de insatisfação que os níveis de abstenção revelam e começa a ser perigoso. Numa entrevista à TVI, anteontem, achei curioso que Coelho tenha referido, por exemplo, que o PND é um “partido sem ideologia, pois tem apenas um objectivo político” e que deixou de ser “um partido de direita” para se transformar numa espécie de albergue onde cabem todos os que queiram a mudança política na Madeira e deixaram de acreditar na restante oposição. O perigo (político, claro) deste discurso é sobretudo para os partidos do contra, muitos deles apoiaram, incentivaram e até instrumentalizaram, Coelho, e pagam agora a factura. Mas dizer que, em termos de eleições regionais, o PSD já perdeu, que o Bloco vai desaparecer, que o PS vai ficar reduzido a não sei quantos deputados, etc, são conjecturas que valem o que valem, nada.
Finalmente gostaria que as pessoas entendessem que eu trabalho com base em números, só me interessam análises factuais, tentar perceber oscilações, e finalmente fazer também algumas projecções – que são sempre meros exercícios matemáticos, repito – com a noção de que não existem verdades absolutas. A terceira parte deste rescaldo será meramente de apreciação aos resultados, na certeza de que há casos concretos que podem ser tidos em consideração: Cavaco Silva perdeu em três dos concelhos mais populacionais (excepto Câmara de Lobos), ganhou em todas as freguesias dos concelhos mais pequenos, bem como no Porto da Cruz e Santo da Serra (ambas em Machico), na Sé, Imaculado Coração e Santa Luzia (todas no Funchal) e Santo da Serra (Santa Cruz).
Quando uma semana antes das eleições presidenciais constatei a preocupação de alguns partidos da oposição, de menor dimensão, pelos resultados do candidato Coelho e se questionavam sobre as consequências disso nos próprios resultados eleitorais de Outubro deste ano – e foram várias as picardias entre José Manuel Coelho e o PCP e o Bloco de Esquerda - finalmente aceitei que em jogo estava muito mais do que um simples capricho, um acto aventureiro ou uma encenação. Em jogo estava claramente a autonomização de José Manuel Coelho face ao próprio PND, não tendo sido pró acaso que os alegados dirigentes do partido estiveram sempre discretamente distantes, provavelmente por saberem que a candidatura presidencial de Coelho não podia ser confundida com o PND. Julgo que se pode afirmar que, independentemente dos resultados daqui para a frente, das derrotas que o PND naturalmente vai obter – porque em democracia as cosias funcionam assim, ora para cima, ora para baixo - Coelho conseguiu a “maioridade”, ou seja inverteu as regras do jogo no seio do seu partido. Explico O PND ficou refém dele – não é que isso incomode a estrutura partidária em causa que nem sequer uma sede oficial tem! - e nas regionais de 2011 não terá outra opção senão a de candidatar o próprio Coelho, seja qual for o resultado que este venha a conseguir. Obviamente que sendo actos eleitorais diferentes poderão surgir argumentos internos destinados a “travar” a euforia de Coelho. Mas que os resultados alcançados por ele causaram evidente incómodo aos dirigentes do PND, disso não duvido. Tal como se passaria rigorosamente o mesmo com outro partido nas mesmas circunstâncias.
Retomando o meu rescaldo – que reflecte o que eu penso independentemente de concordarem ou não – quando falo das novas tecnologias e das potencialidades que elas colocam aos políticos, bastar-me-á perguntar: que campanha fez Coelho no Continente, onde salvo raríssimas excepções, aparecia nas televisões como um ”coitadinho” sem grandes movimentações populares à sua volta? Mas uma coisa ele viu garantida, a sua presença diária nas televisões e nos meios de comunicação social em geral, em tempos de antena equitativos, muitas vezes para falar de questões que nada tinham a ver com as presidenciais. Mas isso o que importava? E para além disso, há que recordar, Coelho foi fortemente prejudicado por um comportamento indigno das televisões nacionais, vergonhoso em termos da ética e da deontologia jornalísticas, e atentatório das regras democráticas, ao ser posto à margem de debates que nunca deveriam ter sido realizados sem terminar o prazo da apresentação de candidatos. E tudo isto se passou com a cumplicidade asquerosa da Comissão Nacional de Eleições, cujo Presidente deveria ter sido demitido.
Tenho afirmado, e insisto nesta minha teoria, que os resultados das eleições regionais de Maio de 2007 foram enganadores pela inesperada dimensão e podem criar ilusões. Tenho batido nesta questão e não deixarei de o fazer. Corremos o risco, com o actual sistema eleitoral regional, embora a alteração da lei eleitoral possa agora parecer uma tentativa de afastar os partidos mais pequenos, de vermos a região cair numa situação de ingovernabilidade ou de subversão das regras democráticas, caso os partidos perdedores, por via de coligações parlamentares, afastem do poder o partido mais votado. Aconteceu há 5 anos na Galiza com o PP a ser afastado do poder por um deputado (e devido a uma coligação entre os socialistas e os nacionalistas galegos), acontece presentemente em Canárias com o PSOE privado de formar governo graças a uma coligação entre o 2º e o 3º partidos (PP e a Coligação Canária, pró-nacionalista), ainda por cima agora às turras em pleno ano eleitoral local. O problema é que, eleitoralmente falando, a Madeira não estava preparada para situações como as que Coelho protagoniza, as quais ninguém sabe se reflectem uma tendência de mudança, motivada pela insatisfação, ou se se trata de um fenómeno esporádico e relacionado com a natureza do acto eleitoral. Por isso as regionais de Outubro deste ano, que já eram importantes para uma cabal clarificação eleitoral de Maio de 2007, acabam por ver essa importância acrescida, na medida me que precisam de desmistificar e clarificar estes resultados agora alcançados por José Manuel Coelho e ver até que ponto o PND beneficiária alguma coisa com eles e conseguirá o seu grande objectivo das regionais que é a eleição de um grupo parlamentar, aumentando-lhe assim as prerrogativas regimentais que hoje não tem.
Como comentarista, e sem sectarismos, tenho que reconhecer que o PS é o grande derrotado - se conjugarmos a sua votação com os resultados desastrosos de Alegre - mesmo que os socialistas queiram sacudir culpas ou partilhá-las com o Bloco de Esquerda, que, tal como o PCP, acabam por ser fortemente penalizados na Madeira. Aliás começo a pensar que as regionais de 2011 poder ser (?) um desafio de sobrevivência para mais do que um partido. Duplamente: derrotado porque as pessoas penalizam a desgovernação socialista, penalizado porque as pessoas sabem que são os autores dessa desgovernação por muito que mandem a divagar com iniciativas patéticas ou a fazer discursos inflamados, o PS local precisa de uma profunda reforma, estrutural, funcional, de pessoas e de discurso. Não podem os socialistas andar a reclamar mudanças no PSD da Madeira, quando são mais do mesmo, pois na realidade estamos perante figuras que não inspiram qualquer confiança, quando foram, os responsáveis pela derrota socialista nas regionais de Maio de 2007, mas que estão agarrados ao poder qual lapas que não o largam
" (Jornal da Madeira)

Sem comentários: