terça-feira, junho 22, 2010

Alberto João Jardim: "Passei a exigir que tudo me fosse apresentado por escrito"...

"Durante a minha vida pública, consegui uma certa produtividade no meu trabalho, porque procurei sempre me ver livre daquelas situações que só nos roubam tempo. Tendo chegado a funções governativas, logo em 1978 deparei-me com um hábito vindo dos militares abrilinos, de receber e ouvir toda a pessoa que quisesse dizer algo, sem se seleccionar a importância do assunto, ou a necessidade impreterível de haver, ou não, tal reunião. Não se distinguia um pedido de audiência para tratar de um investimento de milhões, de outra para falar sobre invasão do quintal pelas galinhas do vizinho. Até sei de um caso, passado com o meu antecessor, em que após os tradicionais primeiros dez minutos de conversa de chacha, que estas coisas implicam sempre, a Senhora ali se tinha apresentado apenas para perguntar quando é que o Governo Regional ia distribuir veneno para ratos!
Aprendi outra coisa. Havendo um diferendo, a versão de cada uma das partes, se a sós comigo, era completamente diferente, quer de uma, quer de outra, na situação em que eu procurava o contraditório com os dois à minha frente.
Passei a exigir que, primeiro, tudo me fosse apresentado por escrito e, só se justificado, é que mandava agendar audiência. Assim, ou dou logo despacho, positivo ou negativo, ao pretendido, ou encaminho o assunto para o colega de Governo que vai resolver. O tempo que se ganha! Mas fazer entender isto a várias pessoas...
Outro mau hábito, dito «de Abril», era as pessoas baterem à porta da residência privada para lhes resolver qualquer assunto, por ridículo que fosse. Hoje é um descanso, pois fui correndo com toda a gente e indicando onde se deveriam dirigir. Outra praga! Os pedidos de audiência, «para cumprimentos». Comecei a perceber que era tempo perdido e, se calhar, apenas para testar a fotogenia da pessoa recebida. Claro que, salvo as razões excepcionais de Estado em que não posso recusar as tais «audiências para cumprimentos», também acabei com isso. O telespectador deve imaginar a cara do outro lado do telefone, quando a minha Secretária diz: «O senhor Presidente agradece desde já os cumprimentos, considera-se cumprimentado, Vossa Excelência não precisa de se incomodar a cá vir». Claro que, num esquema de trabalho assim, muita gente, depois, deve me chamar nomes horríveis... Mas, não faz mal. Só o que se ganha em tempo e produtividade!..." (Alberto Joao Jardim na rubrica, "Palavras Assinadas", na TVI24, ontem. Veja aqui o video da gravação)

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